8 de mai. de 2013

Uma Bíblia na mão e uma ideia na cabeça


O Papa Francisco, num discurso aos membros da Pontifícia Comissão Bíblica, afirmou que a Igreja Católica é a única intérprete das Sagradas Escrituras. Aliás, esta parte do discurso ganhou destaque na mídia (desiludida ou iludida) que viu no Papa o mesmo sectário que seus predecessores. Bom, e o que dizer? O Papa não disse nenhuma novidade. Jesus fundou Sua Igreja para que conservasse a pureza do depósito da fé. É ao Magistério desta Igreja que cabe a verdadeira interpretação da Revelação escrita. A todos que queiram e sejam capazes disso, é possível trabalhar para melhor entender as Sagradas Escrituras, porém todos são obrigados a se submeterem à Tradição e ao Magistério da Igreja. Mal comparando, a Bíblia está para a Igreja, como a Constituição Federal está para o STF. É à mais alta corte da justiça brasileira que cabe defender e interpretar nossa Carta Magna. Imaginem se as decisões do STF referentes à constitucionalidade das leis começassem a ser contestadas e cada estado decidisse criar seus próprios tribunais para interpretarem a CF. 


Pois é o que vem ocorrendo com a Bíblia desde que o livre exame das Sagradas Escrituras foi criado por Martinho Lutero. O ex-monge agostiniano afirmava que "até a serva do moleiro é capaz de interpretar a Bíblia". Pois bem, já na época de Lutero, foi possível observar a confusão causada por esta tese. No século XVI, entre os próprios luteranos, já haviam deduzido da Bíblia até a poligamia. Um dos líderes laicos do luteranismo casou-se com duas mulheres. Sem um Magistério devidamente constituído, a proliferação de interpretações diversas que ocasionava o surgimento de inúmeras seitas - o que Lutero não imaginou e nem desejou - foi inevitável. 

Martinho Lutero
Outro pilar da doutrina de Lutero é a Sola Scriptura, ou seja, somente nas Escrituras Sagradas é possível encontrar a Revelação divina. Lutero imaginava que era possível interpretar a Bíblia através da própria Bíblia, desprezando a Tradição e as decisões magisteriais, sendo elas conciliares ou papais. O surgimento dos anabatistas, zwinglianos e calvinistas foi a prova de que Lutero estava errado. Todos tinham exatamente a mesma Bíblia como regra de fé, mas as interpretações variavam consideravelmente. Lutero morreu angustiado com o resultado de sua obra. E o coitado nem imaginava que o pior ainda estava por vir. Para se ter uma ideia do tamanho da confusão, no mesmo ano que Lutero morreu, foram encontradas mais de 200 interpretações apenas para um versículo da Bíblia: "Isto é o meu corpo". 

Com a impossibilidade de uma igreja unificada vinda da Reforma - não faltaram tentativas, todas fracassadas -, o protestantismo seguiu sua dinâmica própria de esfacelamento. Surgiram os batistas, pois a Bíblia diria que só os adultos devem ser batizados; surgiram os unitaristas, pois a Bíblia afirmaria que Deus é uno e único e a Trindade é uma aberração politeísta; surgiram os que encontram na Bíblia que a alma morre com o corpo ou que "dorme" até a ressurreição, enquanto outros afirmam que a mesma Bíblia diz que a alma vai para junto de Deus. E agora surgem até igrejas que afirmam categoricamente, baseadas nas mais "avançadas pesquisas" bíblicas, que esta não proíbe as relações homossexuais, pelo contrário, até as aprovariam. Os pastores da IURD, por exemplo, já encontram na Bíblia argumentos pró-aborto. E sobre a Teologia da Prosperidade não é preciso nem falar.

Desta forma, a Bíblia cai em descrédito. O protestantismo, com o afã de destruir o Magistério da Igreja, recusou-lhe qualquer autoridade. Como consequência, dois séculos e meio após a revolta protestante, era a própria Bíblia que caía em descrédito sob os ataques dos racionalistas e, por fim, a existência de Deus foi posta em xeque. Afinal, onde encontrar a Verdade se há tantas igrejas, todas afirmando que obedecem o mesmo livro sagrado, mas com doutrinas tão discrepantes? Santo Agostinho afirmava: "Eu não acreditaria no Evangelho, se a isso não me levasse a autoridade da Igreja Católica". Lutero, como monge agostiniano que era, deveria ter considerado a frase daquele que deu uma Regra a sua Ordem.




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