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A Revolução Francesa instaurou na Europa o modelo republicano como forma de governo. Em seu bojo, trazia o anticlericalismo clássico e o laicismo radical gestados, sobretudo, nas lojas maçônicas espalhadas por todo o continente. Mesmo em regimes democráticos e republicanos, como na França, a Igreja se viu privada de seus bens. Por exemplo, desde as leis anticlericais de 1905, a Igreja na França tem a custódia, mas não a propriedade de seus templos. Em Portugal, com o advento da república em 1910, leis anticlericais e anticatólicas foram postas em prática com o confisco das escolas confessionais, a expulsão de ordens religiosas e a proibição do uso de trajes clericais em público. Porém, os multiformes ideários maçônicos seriam apenas uma pequena amostra do que poderia ser feito à Igreja se uma verdadeira doutrina com sua forma antirreligiosa de ser e agir bem definida chegasse a ser posta em prática. E este momento chegou em 1917 com a Revolução Russa e a implantação do marxismo naquela que viria a ser conhecida como a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.
A oposição à religião faz parte da essência filosófica de Karl Marx. Conforme o filósofo alemão, para que o homem – medida de tudo – se liberte, é necessário, entre outras coisas, que não se prenda em dogmas e instituições eclesiásticas. Como parte da corrente do humanismo ateu, considera Deus um entrave para o livre desenvolvimento humano. Para isso, importa que desapareça a religião, a Igreja e mesmo a idéia de Deus. No conceito teleológico marxista, a religião naturalmente desapareceria com o regime capitalista, posto que é uma superestrutura deste. O movimento dialético da História se incumbiria de eliminá-la. Porém, como ainda se encontra em fase de transição para esta sociedade comunista onde o capitalismo e suas superestruturas desapareceriam, faz-se necessário uma guerra ininterrupta contra a religião e a Igreja Católica é eleita como o principal inimigo a se abater. Serão usadas as tradicionais armas do laicismo, mas se superará em métodos mais sofisticados e violentos (ROPS, 2006, pp. 39-40). É o que verificamos no primeiro país onde o marxismo se saiu vitorioso.
Apesar de a grande maioria dos cidadãos da URSS pertencer à Igreja Ortodoxa Russa, havia uma parcela não pouco significativa de católicos latinos e greco-católicos nos territórios da Rússia, Lituânia e Ucrânia. Desde o tempo dos czares, os católicos nunca tiveram plena liberdade de culto na Rússia e em diversas ocasiões foram pressionados a incorporarem-se ao patriarcado de Moscou. A violência do período stalinista levou o grande público a imaginar que as perseguições e expurgos na URSS fossem obras exclusivas de Josef Stálin. Mas, desde os primórdios do regime comunista na URSS, as perseguições aos crentes de diversas religiões se fizeram presentes, sendo mais duras contra os católicos acusados simplesmente de servirem a uma “força” estrangeira: o Vaticano.
Lênin inventou os métodos de perseguição religiosa usados por todos os regimes totalitários do século XX. Declarava Lênin, apud. Royal (2001, p. 64) sobre a religião:
A religião é o ópio do povo. Esta afirmação de Marx é a pedra de toque de toda a visão marxista do mundo no que toca ao problema da religião, todas as religiões contemporâneas, todas as igrejas e todos os tipos de organizações religiosas serão sempre vistos pelo marxismo como órgãos da reação burguesa que servem para defender a exploração e a neutralização da classe trabalhadora [...] É preciso saber como lutar contra a religião [...] Essa batalha tem que ser entendida em ligação com a práxis concreta de um movimento de classes dirigido para a eliminação das raízes sociais da religião.
Logo após a Revolução, no início de 1918, os fundos das igrejas e mosteiros foram confiscados. Templos e seminários foram nacionalizados e entregues aos sovietes locais e a Igreja passou a ser proibida de manter alguma propriedade. Publicações e bibliotecas católicas seriam dirigidas por comissários do povo. Escolas católicas passaram ao Estado ou foram fechadas. Só em São Petersburgo, 20 mil crianças católicas das 11 escolas primárias ligadas à Igreja ficaram privadas de receber educação religiosa. Um grave ataque contra a liberdade de consciência (ROYAL, 2001, p. 67).
Na grande fome de 1921-1922 que vitimou milhões de soviéticos, Lênin aproveitou a ocasião para levar a cabo o confisco dos bens da Igreja. A Santa Sé não poupou recursos humanos e financeiros, chegando a alimentar meio milhão de pessoas diariamente na URSS. Se o argumento do confisco era o de alimentar a população, o Vaticano propôs comprar os vasos sagrados e demais utensílios religiosos confiscados. Tudo em vão. A fome era somente mais um pretexto para dar continuidade à limpeza religiosa. Lênin expulsou os religiosos que alimentavam a população e ordenou a execução de membros do clero que protestasse contra o confisco, solicitando relatórios diários sobre o número de sacerdotes executados (ROYAL, 2001, p. 65).
No final de 1922, todas as igrejas de Petrogrado foram fechadas pelo exército e todo o clero, incluindo o bispo, foram presos e enviados para Moscou. Por toda a URSS, bispos e sacerdotes, acusados de agir em favor da Polônia ou do Vaticano, foram presos e enviados aos campos de trabalho forçado. Outros, brutalmente assassinados. Católicos de origem polonesa e rutenos da Ucrânia foram massacrados, outros enterrados vivos. Na costa do mar Negro, uma população católica descendente de alemães composta por 200 mil pessoas, foi deportada para a Sibéria e Cazaquistão. Mesmo com a precária situação econômica, teve início uma maciça propaganda ateísta que consumia grandes somas de dinheiro para desacreditar a Igreja com piadas grosseiras e falsas acusações contra o clero com o intuito de apresentar a Igreja como a responsável pelos males e que, portanto, deveria ser odiada. Acusados de conspiração ou atos de terrorismo (o que correspondia a ensinar o catecismo, por exemplo) as condenações iam da prisão perpétua à pena de morte. Igrejas, hóstias e objetos religiosos foram profanados. Na Ucrânia, das 68 igrejas, 52 tiveram seus objetos e fundos roubados pelo Estado (ROYAL, 2001, pp. 68-72).
Já em 1923, o número de padres católicos na Rússia caiu de 245 para setenta. Entre 1917 e 1925, duzentos mil católicos desapareceram sem deixar rastro. Em Moscou e São Petersburgo, centenas de leigos, religiosos e sacerdotes, incluindo toda a comunidade de freiras dominicanas foram presos e até hoje não se conhece seu destino final. Em 1924, não havia sequer um único bispo católico em liberdade na URSS (ROYAL, 2001, p. 73). Dez anos mais tarde, das 3300 igrejas e duas mil capelas católicas existentes na Rússia pré-revolucionária, ficaram abertas apenas duas que eram usadas pelo governo para demonstrar á comunidade internacional a liberdade religiosa existente na URSS.
Durante o regime de Stálin, o ditador levou a diante a limpeza religiosa no país. Cooptou a grande maioria da Igreja Ortodoxa Russa, principalmente após seu ato nacionalista contra os nazistas em 1943 e pressionava os católicos a abandonar Roma e aderir à Moscou. A mão de Stálin pesou principalmente sobre a Igreja Católica Grega, na Ucrânia. Em 1929, foi deflagrada uma perseguição aos padres católicos da Ucrânia. No ano seguinte, centenas de leigos e 35 padres foram presos e enviados para as ilhas Solovetski, no mar Branco, um campo de concentração para onde a maioria dos religiosos era enviada para trabalhos forçados.
Os soviéticos queriam que os prisioneiros construíssem um canal entre o mar Branco e o Báltico. Frequentemente, o trabalho consistia em ordens do dia extenuantes, que determinavam o transporte de blocos de gelo ou de neve ou o corte de madeira. A alimentação era tudo menos adequada ao tipo de trabalho e aos rigores do clima. Os barracões onde dormiam estavam de tal maneira sobrelotados que se tornava difícil respirar lá dentro. O sistema tinha sido pensado por forma a vergar lentamente os prisioneiros, com exceção dos mais fortes, extorquindo-lhes a maior quantidade possível de trabalho manual durante 16 horas por dia, sete dias por semana. Em conclusão, tratava-se de uma verdadeira escravatura (ROYAL, 2001, p. 83).
Sacerdotes e freiras eram retratados como grupos fanáticos que planejavam atos terroristas, atentados contra Stálin e o regresso ao capitalismo. Homens e mulheres da Igreja eram presos e torturados com choques elétricos e banhos frios em pleno inverno russo para que delatassem pretensos planos conspiratórios contra o regime. Sacerdotes greco-católicos tinham seus filhos ameaçados de morte. Muitos morreram nestas sessões ou acabaram seus dias num manicômio.
Em 1929, os cultos religiosos foram proibidos até mesmo nos campos de concentração. Os religiosos presos foram proibidos de usar o hábito e fornecer qualquer auxílio espiritual aos outros presos. Mas o pior ainda estava por vir. Em 1937, Stálin determinou que os ministros religiosos fossem presos “para que sejam imediatamente executados os elementos mais perniciosos através de medidas administrativas adotadas nas sessões das troikas” (WENGER apud. ROYAL, 2001, p. 63) e a medida também foi estendida aos que já estavam presos. Nicolai Yezhov, ministro de assuntos internos, se encarregou de aplicar tal determinação contra homens e mulheres da Igreja em prisões, campos de trabalho forçado, colônias e que já tivessem sido julgados por crimes ou se encontrassem em liberdade depois de cumpridas as penas. Foram rejulgados e a maioria condenada à morte (ROYAL, 2001, pp.63 e 78).
Se a perseguição à Igreja na Ucrânia já era uma realidade desde 1929, onde todos os seminários foram encerrados, os periódicos católicos proibidos de circular e as escolas católicas suprimidas, após a Segunda Guerra a situação se tornou insustentável. Acusados de colaboracionismo com os nazistas – de fato, no princípio, os nazistas foram vistos pelos ucranianos como libertadores do jugo soviético – e de serem agentes da Polônia e do Vaticano, os greco-católicos passaram a ser reprimidos sistematicamente pelo regime soviético, sobretudo na Ucrânia Ocidental, onde o número de católicos era maior.
Em 14 de março de 1945, Georgii Korpov, presidente do Conselho para os Assuntos da Igreja Ortodoxa Russa, apresentou a Stálin a Instrução 58 que propunha liquidar a Igreja Católica Grega na Ucrânia. Utilizando-se de católicos simpatizantes do regime, pressionaria os greco-católicos a unirem-se ao patriarcado de Moscou. A estratégia incluía uma série de propagandas anticatólicas acusando a Igreja Católica de colaborar com os nazistas durante a guerra e com o “império americano” no pós-guerra e, portanto, inimiga do povo ucraniano e promotora de seus males (ROYAL, 2001, pp. 102-103). No mês seguinte, os bispos se recusaram a aderir à Igreja Ortodoxa e foram presos. Somente um bispo ficou em liberdade, Teodor Romzha, que foi assassinado num hospital por uma agente da KGB disfarçada de enfermeira. A prisão era um claro sinal do destino que aguardava clérigos e leigos que recusassem a assimilação. Conforme afirma Royal (2001, p. 104), estes bispos foram condenados a longos anos de prisão. Uns morreram durante sessões de tortura, outros acabaram suas vidas nos campos de concentração.
No ano seguinte, veio o golpe final: a Igreja Católica na Ucrânia era composta por quatro dioceses, oito bispos, 2772 paróquias, 4119 igrejas e capelas, 142 mosteiros e conventos, 2628 padres diocesanos, 164 monges e 773 freiras, 229 seminaristas e mais de quatro milhões de fiéis. Foi simplesmente abolida, posta na ilegalidade. Bispos, padres e leigos que resistiram acabaram em campos de trabalho forçado, mortos pelo cansaço, executados ou exilados (ROYAL, 2001, p. 94).
Como a maioria dos registros das ações contra os católicos na URSS continuam indisponíveis aos pesquisadores é difícil afirmar quantas foram as vítimas da repressão soviética.
O que podemos, contudo, afirmar com segurança, à luz de documentos já disponibilizados, é que 344 clérigos, nos quais se incluem basicamente bispos, padres diocesanos e membros de ordens religiosas, constam dos registros oficiais como “reprimidos”. Só na Ucrânia, mais meio milhão de leigos foi preso ou mandado para o exílio interno, parte dos quais, sem dúvida, exclusivamente por motivos religiosos (ROYAL, 2001, p. 109).
Nos países comunistas do Leste europeu, os católicos eram proibidos de ascender profissionalmente. A vida daqueles que faziam parte da Igreja era obstaculizada nas universidades. As crianças eram desencorajadas a aprender religião desde o ensino primário, posto que a continuação dos estudos universitários podia ser barrada por este motivo. Os católicos formavam uma casta inferior nos países comunistas ocupando os postos de trabalho mais humildes e mal remunerados. Um verdadeiro apartheid.
Após a Segunda Guerra Mundial, o Leste europeu caiu sob o domínio do comunismo e entrou na órbita da URSS. Na Polônia, entre 1945 e 1947, mesmo anterior a perseguição aberta, cerca de duzentos padres mais influentes simplesmente desapareceram (ROYAL, 2001, p. 270). Após as eleições de 1947, o regime comunista passou a tratar a Igreja como era típico, confiscando seus bens, expropriando hospitais e escolas religiosas e proibindo publicações católicas. A propaganda governamental, assim como na Ucrânia, acusava a Igreja de colaborar com os nazistas e o clero, de imoralidades. No ano seguinte, quatrocentos padres estavam encarcerados e um entre eles já havia sido condenado à morte (ROYAL, 2001, p. 270).
Na Hungria, a Igreja Católica sempre esteve próxima ao governo e este relacionamento manteve-se com o regime comunista. Contra este improvável casamento, levantou-se o cardeal primaz da Hungria, Joszef Mindszenty, que acabou preso com outros seiscentos padres. Torturados por quarenta dias ininterruptos e ameaçados de deportação para trabalhos forçados na Sibéria, capitularam. Sendo assim, a Igreja perdeu sua força na Hungria tendo como resultado o confisco de todas as escolas religiosas e o banimento de todas as ordens religiosas húngaras fazendo com que dois mil religiosos tentassem fugir do país. Muitos foram presos e mortos (ROYAL, 2001, p. 273).
Em 1950, o governo da Tchecoslováquia eliminou as ordens religiosas transformando os mosteiros e conventos em campos de concentração onde os próprios religiosos eram mantidos presos e condenados a trabalhos forçados. Setenta e cinco por cento dos quinze mil religiosos, metade dos sete mil padres e milhares de leigos foi condenada a trabalhos forçados em regime de escravidão e enviados às minas e pedreiras do país (ROYAL, 2001, p. 277).
Na Albânia, o regime comunista aplicou os métodos de perseguição tradicional: fechou jornais católicos, confiscou bens da Igreja, nacionalizou escolas, creches e hospitais. Padres e leigos que protestavam eram presos e expulsos do país se fossem estrangeiros. A Ação Católica foi desmantelada. O governo tentou criar uma igreja nacional pressionando o clero a abandonar a comunhão com Roma. A hierarquia católica recusou com veemência. As conseqüências da recusa não demoraram a vir: padres e religiosos estrangeiros foram expulsos; em 1945, a Companhia de Jesus foi considerada ilegal; em 1947, foi a vez dos franciscanos serem banidos do país. Membros do clero foram presos, torturados e condenados à morte. Certa vez, vinte clérigos foram fuzilados de uma só vez. As execuções eram transmitidas pela rádio. Quem escapasse da morte era condenado a trabalhos forçados (ROYAL, 2001, p. 293). Em 1948, havia somente um bispo vivo e livre na Albânia. Mas não era apenas o clero que sofria todas estas atrocidades. Milhares de leigos que não se declararam publicamente contra o clero foram presos e torturados. Não se sabe o número exato de leigos executados, mas as penas variavam entre o fuzilamento e a fogueira. Em 1949, o confisco das propriedades da Igreja foi levado a cabo. Templos eram convertidos em prédios públicos. A catedral de Shkodra tornou-se um ginásio de basquete. Freiras foram expulsas dos conventos e proibidas de usarem o hábito. O governo exigiu que as instituições religiosas apresentassem suas constituições para que fossem oficializadas. Todas foram aprovadas, menos as dos católicos (ROYAL, 2001, p. 295).
Tal como todos os outros países comunistas, a Albânia declarou que a família era “reacionária” e tentou fazer com que as crianças informassem as entidades oficiais quando os pais lhes dessem instrução religiosa em casa. Os pais foram proibidos de dar aos filhos nomes “religiosos”. Uma família que rezasse o terço em casa podia apanhar cinco anos de prisão; ensinar o sinal da cruz a uma criança podia implicar um castigo semelhante. A mera posse de literatura religiosa podia levar à pena de morte. [...] Dos 156 padres existentes antes do início da perseguição, 65 foram martirizados e 64 morreram durante ou após o encarceramento (ROYAL, 2001, p. 298).
A Lituânia sempre foi conhecida pelo fervor religioso de sua população. A grande maioria do povo lituano era formada por católicos quando começaram as perseguições na década de 1940. O sentimento católico era um obstáculo ao domínio da URSS. Mais de um milhão de lituanos foram enviados aos campos de concentração soviéticos. A perseguição na Lituânia seguiu o conhecido roteiro: confisco de escolas e instituições católicas e fechamento das publicações da Igreja; o casamento religioso foi considerado ilegal e os feriados religiosos abolidos. Durante apenas um ano, “todos os padres do país experimentaram a detenção, a prisão ou os interrogatórios” (ROYAL, 2001, p. 307). Cerca de 150 dentre eles foram torturados para que abandonassem a Igreja. Vários morreram. Após a Segunda Guerra, a Igreja na Lituânia viveu um curto período de paz. Porém, a perseguição retomou sua força. Sacerdotes eram proibidos de dar assistência religiosa a prisioneiros e enfermos. Os professores eram obrigados a ensinar o ateísmo. Os seminários foram encerrados. O governo proibiu as celebrações religiosas e impôs impostos abusivos sobre os edifícios da Igreja. Todos os bispos, os superiores de ordens religiosas e grande número de padres foram presos (ROYAL, 2001, p. 309). Em setembro de 1947, os lituanos escreveram clandestinamente uma carta ao papa Pio XII denunciando as atrocidades contra o povo.
Entre os abusos especificamente religiosos, a carta refere à pressão para criar uma igreja nacional separada de Roma, a prisão sumária e o desaparecimento de padres que se recusaram a tornarem-se informantes do regime, a vigilância generalizada das atividades religiosas, a supressão de associações católicas, bem como da imprensa, das escolas, dos seminários, dos hospitais e de obras de caridade, entre muitas outras coisas. Os detidos eram submetidos a torturas e muitos deles enlouqueceram, a comida eram-lhes tirada e o sono interrompido; a sentença mais “simpática” correspondia a dez anos na Sibéria. Aqueles que sobreviviam à viagem de um mês praticamente sem água nem alimentos não duravam, regra geral, mais de cinco anos. Por meio destes meios diretos e indiretos, mas sempre cuidadosamente ocultados, os soviéticos conseguiram ver-se livres de muitos clérigos e leigos sem darem origem a célebres mártires (ROYAL, 2001, p. 309).
Em 1948, o Partido Comunista da Romênia assume o poder e impõe o regime marxista à nação. Havia um milhão e meio de católicos no país. No final do regime, restarão apenas 500 mil. A Igreja Católica na Romênia era formada por católicos de rito latino e de rito grego. O governo cooptou a Igreja Ortodoxa Romena e esta, sob pressão, convocou um sínodo para declarar que os católicos gregos estavam integrados à ela. Assim, “em 1948, a Igreja Católica Grega foi liquidada, as milhares de igrejas que detinham foram confiscadas e convertidas para o uso dos ortodoxos” (ROYAL, 2001, p. 316). Havia seis bispos greco-católicos na Romênia e todos foram presos acusados de traírem à nação por estarem a serviço de uma força estrangeira, o Vaticano. Sofriam pressão para aderirem à Igreja Ortodoxa. Todos rejeitaram e morreram na prisão. Seiscentos padres foram presos; metade deles morreu na prisão. Nos presídios, eram torturados para que se “convertessem” à ortodoxia. A inventividade das torturas era enorme: ia dos tradicionais choques elétricos e queimaduras a estadias em esgotos infestados por ratazanas. Um quarto dos sacerdotes cedeu, passando à Igreja Ortodoxa.
Não foi apenas a Igreja Católica Grega que sofreu. A Igreja Católica de rito latino era vista como “o único obstáculo à democracia na Romênia”, como afirmou o secretário-geral do Partido Comunista, Gheorghiu-Dej, “e que o governo não permitiria que os cidadãos católicos obedecessem às ordens de líderes estrangeiros, como o Papa, que agia a serviço dos Estados Unidos” (ROYAL, 2001, p. 321). Vários sacerdotes desapareceram e foram assassinados. Segundo Royal (2001, p. 322), “em junho de 1949, não havia nenhum bispo católico romano em atividade na Romênia, quase todas as igrejas estavam fechadas, os católicos romanos tinham uma marca especial no bilhete de identidade”. Dezenas de paróquias estavam ocupadas por milícias.
Apesar da violência que em nada deixa a desejar quando comparada a que sofreram outros grupos religiosos ou raciais, o número de vítimas nas perseguições aos católicos na URSS e nos países comunistas do Leste europeu ainda são desconhecidos. A historiografia pouco se ocupa em pesquisar e relatar o sofrimento imposto aos católicos nos países onde os regimes marxistas triunfaram. A memória dos inúmeros roubos, expropriações, abusos, torturas e assassinatos é mantida, sobretudo, por historiadores que tenham alguma ligação com a Igreja Católica.
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