15 de ago. de 2012

URSS: Quando o sonho se revela um pesadelo


O ano de 2012 marca duas décadas do fim da União Soviética. Mais do que o final melancólico de um império, a derrocada da URSS veio comprovar a ineficácia do marxismo, doutrina filosófica que prometia a liberdade da classe trabalhadora, o fim das classes sociais e de toda a opressão conseguidas através de uma revolução socioeconômica que aprofundaria radicalmente a democracia. Porém, como foi visto, o socialismo funcionava maravilhosamente bem no campo das ideias, mas, quando posto em prática, causou as maiores desgraças humanitárias que a História já testemunhou. No século XIX, o filósofo alemão Karl Marx previa que a revolução do proletariado se daria em algum país altamente industrializado. Mais cedo ou mais tarde iria acontecer nos EUA, na Alemanha ou na Inglaterra. Para surpresa de todos – menos para Marx que já estava morto – a primeira revolução socialista bem sucedida deu-se no Império Russo, país que ainda vivia sob o regime monárquico e feudal. Era o ano de 1917. Enfim, Lênin, o grande líder da revolução bolchevique proclamava a liberdade dos trabalhadores russos, o fim da injustiça e a participação de todos nas decisões do Estado.

Após quatro anos de guerra civil, finalmente é fundada a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, reunindo a Rússia com mais quinze países que já compunham o antigo império czarista. Depois da Segunda Grande Guerra, os países do Leste europeu vizinhos à URSS adotaram o socialismo, formando a chamada Cortina de Ferro. Foram criados os sovietes, pequenos grupos de trabalhadores que tomavam decisões autônomas em âmbito local ou opinavam sobre assuntos nacionais. Logo, o povo soviético percebeu que a tão sonhada liberdade com a promessa de trabalhar quando e como quisesse, sem patrões e exploração estava cada vez mais distante. Instalou-se no governo uma ditadura de partido único; as decisões políticas passaram a ser tomadas por um grupo restrito de burocratas do Partido Comunista; as leis tornaram-se rígidas como o chumbo. Perverteu-se a ideia original: as instituições do Estado que serviam para a promoção da libertação da classe trabalhadora, agora era usada para manter o regime a qualquer custo.

A manutenção do regime socialista tornou-se um fim em si mesmo. O Estado passa a perseguir àqueles a quem foi prometida a liberdade. Instaura-se um regime totalitário que coloca a população em estado de terror constante. O governo desconfia de tudo e de todos. Qualquer movimentação é vista como suspeita e uma provável rebelião. As leis são inúmeras e insuportáveis. É a perversão do Direito que existe exatamente para proteger os mais fracos e não para que seus dispositivos sejam usados para amedrontar ou ameaçar. A classe trabalhadora, até então protagonista da revolução, é vitimada. Se já não há mais patrões, os trabalhadores passam a ser verdadeiros escravos do Estado e a receberem ordens de meia dúzia de dirigentes do PC, que ditam o que, quanto e como devem ser produzidos os produtos agrícolas e industrializados. A liberdade desaparece sob um amontoado de regras e decretos que sufoca a classe trabalhadora. O país se torna uma prisão levando muitos a fugir. Os alimentos eram racionados e os salários congelados. Trabalha-se muito e ganha-se pouco. As pessoas não possuem plena liberdade em explorar todo seu potencial. Sufocadas, fogem para outros países levando consigo todo conhecimento adquirido. A URSS começa a perder seus talentos o que a torna ineficiente em vários setores.

O totalitarismo invariavelmente leva à clandestinidade. O povo pratica atos ilegais com maior freqüência (em meio ao excesso de leis, torna-se impossível cumpri-las). Para se ter ideia do que é considerado um ato ilegal na URSS, basta exemplificar que, tomar uma coca-cola é um ato ilegal. É um círculo vicioso: o aumento da rigidez, leva à clandestinidade, que leva a uma rigidez ainda maior. A população é posta sob total vigilância, pois é preciso proteger o regime contra qualquer ameaça. Todos desconfiam de todos. O vizinho ou o colega de trabalho pode ser um espião, principalmente porque a forma do regime favorece o aparecimento de pessoas que passam a se beneficiar do esquema e tirar vantagens do governo delatando pequenos focos de resistência ou de oposição ao regime que podia, assim, se antecipar a pretensos movimentos de greve ou de contestação, punindo-os exemplarmente. Mais tarde, nem mesmo esses grupos de puxa-sacos e dedos-duros escaparão à fúria do regime. E as punições são muitas e severas: campos de concentração (chamados gentilmente de campos de reeducação, onde os “reeducandos” recebiam treinamento de como servir melhor ao regime), trabalhos forçados, castigos físicos, psicológicos e morais, o exílio, a pena de morte.

A promessa de bem-estar social para os trabalhadores foi total e violentamente esquecida. As pessoas foram esquecidas. Relegadas ao segundo plano, ficaram à mercê de um regime que as usava para se auto-sustentar, onde trabalhavam para produzir para o Estado, combater pelo Estado e quando adoeciam ou se tornavam incapazes ou quando simplesmente o regime decidia, eram imediatamente substituídas ou eliminadas como peças de uma máquina, sem levar em consideração qualquer aspecto de suas vidas. O socialismo que era visto como a vitória do humanismo e da liberdade do homem provou-se ser o oposto, ou seja, um agente de escravização e desumanização.

Dessa forma, a sociedade socialista que deveria ser o ápice da evolução de toda a humanidade durou apenas 75 anos. Entrou em colapso quando o povo que vivia sob as bandeiras vermelhas cansaram da opressão e tenderam – como tendem todas as pessoas – ao direito natural à liberdade. Se os trabalhadores foram os protagonistas da implantação do socialismo, também o foram do seu fim. Manifestações na Tchecoslováquia e na Hungria agitaram o bloco socialista. Os trabalhadores do sindicado Solidariedade, na Polônia, organizaram corajosamente as primeiras greves. O Muro de Berlim é derrubado. Foi o início do fim. Quando o regime se viu seriamente contestado, algo tinha que mudar. E mudou. O líder do governo soviético Mikhail Gorbachev promoveu algumas reformas a fim de salvar o comunismo. Mas não havia mais o que fazer. Era o fim da URSS.

Como todos os fatos históricos, a experiência vivida na URSS e em todo o bloco socialista deixou-nos uma lição. As leis servem às pessoas para que haja ordem e liberdade e para permitir que as pessoas deem o melhor de si e não o contrário. Não apenas nos países socialistas ou em regimes totalitários, mas também em qualquer esfera de poder, na família, nas empresas que mantêm um sistema que prioriza a si próprio ou os resultados ou o lucro em detrimento da pessoa humana estão fadados ao fracasso.

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