9 de ago. de 2013

A bomba atômica de Nagasaki: motivos religiosos influenciaram na escolha da cidade como alvo?

Há 68 anos, um bombardeiro norte-americano lançava sobre Nagasaki uma segunda bomba atômica. A primeira tinha sido lançada fazia três dias, destruindo Hiroshima. O porquê de Nagasaki ter sido escolhida como alvo ainda não é totalmente esclarecido. Não configurava entre as primeiras cidades-alvo sugeridas pelo Estado Maior norte-americano. Militarmente não era a mais importante, ainda mais na altura dos acontecimentos onde o Japão estava enfraquecido, já que suas forças aérea e marítima haviam sido liquidadas. Surge uma teoria, dificílima de ser comprovada, mas que pode ter pesado na triste escolha de Nagasaki: um motivo religioso. 

Catedral de Nagasaki destruída após a explosão atômica
Nagasaki era - e ainda é, apesar do número reduzido de católicos japoneses - a capital católica do Japão. No período entre-guerras, o catolicismo vivia uma expansão jamais vista no Império do Sol Nascente. Neste tempo, São Maximiliano Maria Kolbe, partindo como missionário para o Japão, tinha conseguido resultados extraordinários naquele país. A base de operações do renascimento católico, como desde os primórdios da evangelização japonesa, continuava a ser Nagasaki. Coincidentemente, o epicentro da explosão foi exatamente o distrito de Urakami, o bairro católico da cidade. 

Por que os EUA escolheriam Nagasaki
por motivo religioso? Bem, vejamos. Os EUA são conhecidos por ser um país livre e, quanto à relação com a religião, de sadia laicidade. Mas nem tanto. Houve nos EUA, até meados do século XX, um forte sentimento anticatólico com profundas raízes históricas. Muitas das colônias britânicas que mais tarde viriam a formar os EUA tiveram origens religiosas. Praticamente todas as denominações que eram perseguidas pelo anglicanismo oficial da Inglaterra fugiram para o Novo Continente e tiveram seu pedaço de terra na América: puritanos em Massachusetts; quakers na Pensilvânia; católicos em Maryland. 

Poucas pessoas sabem, mas a primeira constituição da História moderna (século XVIII) que declarava liberdade religiosa para todos os cidadãos foi a da católica Maryland. Graças a isso, milhares de pessoas que eram perseguidas por causa de sua religião, inclusive em outras colônias americanas, migraram para Maryland. Mas o aumento do número de protestantes foi o fim da liberdade religiosa. Indignados por viver sob um governo católico, arquitetaram uma revolta, destruíram a capital Baltimore e tomaram o poder na colônia. Era o fim da liberdade religiosa. 

Com a independência, a liberdade religiosa e a laicidade do Estado foram princípios estabelecidos e consolidados pela Constituição, graças aos esforços do arcebispo de Baltimore John Carroll (seu irmão, Charles Carroll é um dos Pais Fundadores dos Estados Unidos). O ódio anticatólico aumentou no século seguinte, graças a imigração massiva de irlandeses e italianos para os EUA, aumentando o número de católicos no país. Havia uma mistura de racismo com anticatolicismo que ganhou corpo com os W.A.S.P. (White, Anglo-Saxon and Protestant) que afirmavam que os EUA eram para brancos, anglo-saxões e protestantes e cuja expressão violenta foi a Ku Klux Klan, que perseguia os católicos tanto quanto negros e judeus. 

Durante a primeira metade do século XX pouco mudou. O catolicismo era acusado de ser antidemocrático e contrário aos princípios norte-americanos. Julgava-se incompatível ser norte-americano e católico. Ainda que o governo, obedecendo o princípio da laicidade, não se imiscuísse nos assuntos religiosos, sucederam-se na presidência maçons e protestantes nada simpáticos à Igreja Católica. O governo norte-americano apoiou formalmente o México durante a perseguição aos católicos imposta neste país e fomentou o envio de missionários protestantes por toda a América Latina para quebrar a unidade católica do continente. 

Em 1961, a eleição do católico John Kennedy para a presidência dos EUA foi um marco histórico sem precedentes, comparável aos dias de hoje com a eleição do negro Barack Obama. Somente a partir de então e dos movimentos reivindicativos dos direitos civis é que o anticatolicismo norte-americano perdeu forças. Mas voltemos a Segunda Guerra. Houve um precedente que leva a crer na motivação religiosa da escolha de Nagasaki como alvo atômico: a destruição de Monte Cassino. Monte Cassino foi a abadia fundada por São Bento, o pai do monaquismo ocidental, no século VI. Estes mosteiros beneditinos foram os redutos de civilização e cultura durante as trevas das invasões bárbaras na Europa. Foram eles que salvaram o patrimônio cultural e religioso do Ocidente. Por isso, São Bento foi declarado padroeiro da Europa. 

Abadia de Monte Cassino: antes e depois do bombardeio
Em 15 de fevereiro de 1944, Monte Cassino - zona neutra e de propriedade da Santa Sé - foi bombardeado por um grupo de B-17, onde o primeiro dos aviões a bombardear tinha o intrigante código 666. Foi o maior bombardeio da História sobre um único edifício. O argumento era que o mosteiro tinha se tornado uma fortaleza nazista. Na verdade estavam no mosteiro, além dos monges, refugiados civis. Não havia nazistas entrincheirados no mosteiro. Jamais houve. Por incrível que pareça, um general alemão salvou a biblioteca e obras de arte de Monte Cassino, transportando-as para o Vaticano. 

Sendo assim, não é descabido pensar que a escolha de Nagasaki como alvo do segundo ataque nuclear dos EUA tenha alguma motivação religiosa. A explosão matou 90% dos católicos da cidade, dizimou o clero e destruiu as obras missionárias. Nagasaki tornava-se um centro de irradiação do catolicismo não somente para o Japão, mas para toda o Extremo Oriente. A preocupação com a expansão da Igreja no Japão e, consequentemente, pela Ásia após a guerra, pode ter sido, ainda que não determinante, estrategicamente importante na escolha da cidade, pois assim os EUA conseguiriam anular ou ao menos atrasar os esforços da Igreja Católica, considerada, então, contrária aos princípios, interesses e tendências filosóficas e religiosas norte-americanos. 


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